terça-feira, 20 de julho de 2021

ILUSTRAÇÕES & MUSICA

PARANDO POR DUAS SEMANAS - DEIXO AQUI UM VIDEO COM ILUSTRAÇÕES QUE FIZ PARA ESTE BLOG E OUTROS NÃO., COM MUSICA EXECUTADA PELO GRUPO COLETIVO BRASILEIRO.

ATÉ.




domingo, 4 de julho de 2021

Um Cão Sem Coleira

 


Um cão sem coleira passava pela calçada estreita da ponte e sua sombra projetada pela luz dum alto poste, o seguia obstinadamente em direção ao bairro São João.

Do outro lado da ponte, na calçada oposta, um homem esguio fumando um cigarro observava o cão e seguia em direção a cidade.

A cidade! De que lado fica a cidade?

 A cidade na direção do cão. A cidade na direção do homem.  

O rio por baixo, se arrastava cinza e operoso alheio a tudo que se passava ali, naquele ponto. O ponto onde o homem agora já passara e parara de fumar e o cachorro sem coleira, pertinente, sumia de vista, engolido pela paisagem predominada pelo vai e vem de automóveis sobre o leito carroçável.

O dia começou. E de fato, aquele fato comentado agora mesmo, quando saltou a sola do sapato...  Olhei o rio e fiquei admirado. O rio e aquela espuma se debatendo na corrente, um galho solto escorrendo tão rápido sobre a superfície lisa e viscosa do rio.

Sobre a margem, um casarão sombrio se guardava como que observando a passagem do rio, que sempre passa, e deixa a impressão que não passou.  O casarão coberto por sombras disputando o sol. O casarão, onde habitaram sonhos e pesadelos. Onde habitaram amores e desamores, alegrias e horrores.

O casarão na beira do rio, o rio calado engolindo tudo.

Um cão sem coleira passava pela calçada estreita da ponte se sua sombra projetada pela luz de um alto poste, o seguia obstinadamente em direção ao bairro do São João.

 

 

 

segunda-feira, 28 de junho de 2021

A METAMORFOSE



Despertei me sentindo um traste.

Mal conseguia me mexer.

Me sentia como um peso enfiado no fundo do colchão.

Minha cabeça pesava mais que uma marreta.

Tentei me mover e não conseguia.

Mais eis que como uma névoa se dissipando a sensação se foi.

Que loucura! De repente senti que eu levitava.

Que mudança! Sai do quarto levitando.

Nem sei como cheguei ao banheiro.

Não me reconheci no espelho!

Dali fui direto para a cozinha.

Talvez fosse tudo um sonho kafkiano!

Tomei café cantarolando: 

- Prefiro ser esta metamorfose ambulante!

sábado, 19 de junho de 2021

O Povo Unido



        Foi numa tarde esquecida pelo tempo, fim dos anos 70, que eu estava caminhando numa rua movimentada no centro da cidade de São Paulo. Um grupo teatral estava fazendo uma performance num largo ao lado de onde se iniciava um calçadão, ante pessoas alheias que passavam por ali como um cardume de peixes apressados, ainda que uns engravatados com pastas pretas, óculos escuros ou não, paravam olhando em volta como que perplexos ante aquele emaranhado de paredes sem céus, tudo cinza e branco misturado as cores de camisetas, camisas e as mantas marrons do grupo teatral.

        Meus olhos se fixavam num gesto mirabolante de um dos integrantes do grupo teatral quando ouvi o som pela primeira vez daquele tambor solitário. No meio da multidão, iluminado, um ser sem cor, sem idade e sem sexo, tocava seu tambor e cantarolava incessantemente

         – O povo unido jamais será vencido! O povo unido jamais será vencido!

        Aquele ser passando como que em câmara lenta no meio da multidão apressada, repetia o mantra e caminhava adiante sem parar, passando, atravessando a corrente.

        O povo unido jamais será vencido!

        Naqueles dias cheguei a ver este ser em outras paradas, em outros momentos, o vi pisoteado nos dias de diretas já. Vi ele de soslaio num dia de caras pretas pelas ruas de uma cidade do interior. Vi ele numa favela abandonada na beira da estrada de rodagem. O vi no exterior numa tarde esquecida num parque, entre fileiras embandeiradas de gente alegre festejando o que chamavam de democracia. O vi numa sala escura com tantos olhos iluminados, lacrimejantes sorrindo para não chorar, acreditando no futuro. 

    O vi em alguns filmes e fotografias, surreais, reais, escondidas, publicadas, esquecidas através dos tempos. Vi ele em ocasiões esporádicas.

    Ontem de tarde, levei um susto. Estava meio que esquecido diante do computador lendo notícias pensando em escrever. De repente escutei vindo da rua aquele batuque familiar, surdo, e a voz, agora fina, mas firme, dizendo repetidamente

    - O Povo unido jamais será vencido!

-     O Povo unido jamais será vencido!

        Olhei pela janela, já havia virado a esquina.

        Cadê o povo?

segunda-feira, 14 de junho de 2021

A SUA PORTA

 

                           

 

Lá vem os dois. Qual seus nomes?

Que diferença faz na tarde, na noite e na manhã que eles cruzam o meu caminho?

Relevante é o ser, e eles são um par de pessoas dignas da minha atenção.

            Ele com seus permanentes óculos escuros. Espessa barba com alguns fios grisalhos lhe tomando o rosto, um gorro, por vezes um chapéu, sempre trajando uma jaqueta de linho ou algodão, calças pretas, botas gastas.

    Ela com seu cabelo rastafári chegando aos ombros, coxas grossas expostas como dois pilares reluzentes, jamais abre mão do shortinho que usa, a blusa agarrada ao corpo, expressão séria que sempre traz no rosto, altiva, olho no olho, ágil e forte mesmo com seu ar cansado.

    Os vejo por aí, ao passarem diante do cemitério, sentados num banco de praça perto da Matriz, numa sarjeta nos arredores do Mercado, na praça de um bairro adjacente ao centro.  Parados, conversando um com ou outro ou dividindo entre si, seus achados catados nas ruas, nas portas de casas, nos lixos, no acaso de uma oferta generosa, que as vezes tem.

    Eles são duas incógnitas lembrando-me, lembrando-nos que a conta não fechou, que há uma ponta solta neste campo social onde sementes são plantadas e muito poucas brotam.

            Eu os vejo sempre por aí. Você os vê batendo a sua porta?

 

terça-feira, 8 de junho de 2021

O DELÍRIO OPOSTO


            Os opostos se atraem. Foi assim que eu ouvi da voz do locutor na tela da TV. Sorridente, ele proferia a afirmação citada. Pensei primeiramente na jogada comercial que este locutor estava fazendo ao anunciar a exibição de um filme naquele canal. 

        Fazendo uma inverdade parecer verdade, uma vez que, na vida humana, opostos não se atraem. E se se atraem é para digladiar, um atacar o outro.  Sim, há as exceções de fato há. Mas não há a necessidade de se averiguar que há mais conexão entre os similares do que entre os opostos.

Em várias esferas, sejam elas sociais, religiosas, cientificas, culturais, cabalísticas, etílicas, clubistas, partidárias, e diversas mais.

Não vejo uma pessoa vegetariana curtindo o ambiente de um churrasco de picanha, linguiça e frango. Nem um umbandista se confraternizando com um evangélico. Mas sim há exceções, acredito nelas, vivo permeando-as, querendo mais e mais vivencia-las. Mas não é o consenso geral. - “Não é o que rola” – diria o meu amigo hippie de plantão.

- “Vamos tocar um rock bem pesado na casa da Opera.”  Falou o doidáo sem consideração. 

Estacionou seu carro super equipado com autos falantes internos e externos em frente da casa da dona Opera e conectando o pendrive no aparelho de som, o ligou no volume máximo. Em instantes, dona Opera abriu a porta de sua casa e saiu em direção a rua, cantando em alto brado: 

- “Oh! Mama: mia! Mama mia! “